top of page
  • Sep 14, 2020
  • 4 min read

Pela manhã:


- Hey, bro...


- Fala, man.


- Cara...


- Fala.


- Deixa para lá…

- Fala logo carai!


- Fala baixo!


- Foi mal, mas fala logo!


- Cara, tô vazando...


- Como assim?


- Tô de saco cheio... Não aguento mais esse trabalho de cão enquanto o Silveira fica comendo em restaurante caro e eu comendo marmita. Cansei.


- Beleza, mas de saco cheio eu também tô e nem por isso tô saindo por aí pedindo demissão. Fala logo o que aconteceu de verdade.


- Tá bom, véi! Vou falar.


- Então fala!


- Aceitei a proposta do Peixoto.


- Peixoto dono da...


- Esse mesmo.


- Caraca... O Silveira vai ficar puto de perder mais um funcionário pro Peixoto, você já é o quarto em dois meses, tamo sem diretor até hoje.


- Pois é... Ele ainda acha que sou o estagiário de seis anos atrás. Tô cansado de pegar as pica dele e não ser valorizado.


- Entendo... Mas ele te deu aumento, não deu?


- Foi uma merreca e já vai fazer dois anos.


- E quanto o Peixoto te ofereceu?


- Mil conto a mais, vale-alimentação e sair no horário.


- Porra, aí sim! Até eu topava trabalhar pro Peixoto se fosse assim. Caiu pra cima! Meu sonho ter vale-alimentação. Sair no horário, então...


- Pois é...


- ...


- ...


-Beleza, fala logo o que você quer.


- É que assim... Ainda não falei pro Silveira que vou sair e não sei direito como falar, ele sempre tá ocupado.


- Manda uma mensagem, um e-mail, sei lá.


- Eu já pensei nisso.


- E por que não mandou?


- É que não sei se ficou bom o que eu escrevi. Você que escreve melhor podia dar uma olhada pra mim? De repente dar um tapa...


- Tá bom, manda aí.


“Bom dia Silveira, tudo bem?


Eu recebi uma proposta muito boa pra trabalhar em outra empresa e acho que vai ser mtu importante pra mim aceitar em termos de experiência e claro pela grana.


Minha ideia era continuar aqui, afinal, sou muito grato pela oportunidade de trabalhar aqui e por tudo que aprendi e gosto de trabalhar aqui, além de eu ser “um prata da casa” como vc gosta de falar, que começou como estagiário. Mas acho que chegou a hora de novas experiências.


Se quiserem, tenho boas indicações pra me substituir aqui.


Abraço!”


- E aí, o que acha?


- É, não tá ruim não, mas vou dar um tapa. Acho que pode dar uma valorizada em umas coisas, ser mais direto em outras e melhorar a escrita. Pera aí que já te mando.


- Beleza.


“Bom dia Silveira.


Essa semana eu recebi uma proposta muito boa de outra empresa também muito boa. Avaliei a proposta e cheguei a conclusão que será muito importante aceitá-la, tanto para a minha experiência e pelo projeto apresentado, quanto pelo patamar financeiro.


Minha ideia antes era seguir aqui, afinal, sou muito grato pela oportunidade que recebi, tendo começado como estagiário e ter me desenvolvido, porém, preciso continuar evoluindo. Cheguei à conclusão que é hora de novas experiências e novos ares.


Se quiserem, tenho indicações para o meu lugar. Espero que encontrem alguém à minha altura e com a minha dedicação.


Forte abraço...

...e uma trolha bem grande no seu rabo arrombado de cabrito. Bjus de luz.


- E aí, que tal?


- Perfeito! Acabei de enviar no zap!


- Sério que você gostou?


- Claro!


- Até do final?


- Uai, sim, por quê?


- Até da parte em negrito?!


- Essa parte do cumprimento eu nem li, só prestei atenção no conteúdo.


- Como assim você não leu até o final? Tá em negrito, gritando na sua cara!


- É só um cumprimento, quê que tem demais? Deixa eu ler essa porra de novo... Eita caralho!


- Você só pode tá brincando comigo! Você enviou mesmo?


- Enviei!


- Puta merda...


- O quê que eu faço agora?


- O que você faz?! Apaga a mensagem, carai!


- Ih...


- O quê?


- Já deu tracinho azul...


- Cacete...


- E agora?


- Sei lá, segura o semblante. Não fala mais nada. Tá no inferno, abraça o capeta.


- Por que você fez isso comigo, cara?


- Porra, pensei que você ia ler tudo e a gente taria rindo agora e dizendo “imagina se você tivesse enviado”. Mas não, você tem preguiça de ler.


- Mas o texto tava bom! E eu confio em você. Ou confiava...


- Foi mal! Mas era pra você ter lido tudo!


- Eita...


- O quê?!


- Ele respondeu aqui: “conversamos mais tarde na minha sala” com ponto final.


- Eita!


- Tô fodido...


- Por que você enviou essa mensagem sem ler?


- Por que você cagou na mensagem?! Vou acabar recebendo justa causa e perder o acerto...


À tarde:


- E aí, como foi o papo com o Silveira?


- Cara...


- Quer uma água? Você parece que vai desmaiar...


- Ele não me demitiu.


- Então deu tudo certo! Não foi justa causa, você se demitiu e vai receber o acerto!


- Não foi bem assim. Eu entrei na sala e ele começou a rir e mandou um “senta aí, sócio”. Falou que leu a mensagem e disse que já tava ficando puto pelo Peixoto ter roubado mais um funcionário dele, mas que aí chegou no final da mensagem e entendeu que era uma piada minha, que eu nunca ia aceitar sair da empresa que me formou e que entendeu o recado, que tava na hora de eu ser valorizado, que eu já tinha passado em todos os testes.


- E agora?!


- Fui promovido. Agora sou diretor.


- Sério?!


- Sim... Vou receber o dobro que o Peixoto me ofereceu, sala própria, etecetera, etecetera.


- Pô, parabéns! Então você é meu chefe agora?!


- Não...


- Ué, vai ser diretor de outro departamento?


- Também não...


- Então o quê?


- Ricardo... Você tá demitido.

  • Aug 28, 2020
  • 14 min read

Assim como no texto inaugural, essa história eu tinha guardado para outro momento. Dessa vez não para a Folha ou outro portal, mas sim para contar para o meu amigo imaginário Fábio Porchat. Mas como ele anda muito ocupado e talvez esse momento possa demorar ou até mesmo nunca chegar, resolvi escrever porque acho que meu grande público merece ouvir/ler em primeira mão antes que a história pereça e perca boa parte da graça.


Quem me conhece... Um adendo importante: eu odeio quando alguém vem com esse papinho de quem “quem me conhece”, geralmente pra justificar uma merda e tipo, foda-se, se você fez ou não fez a merda, pouco importa se te conhecem ou não, mas bora lá. Retomando. Quem me conhece sabe que sou um cara difícil para sair. Não curto lugares cheios, com música que não seja do meu agrado e principalmente pagar caro para comer e beber, além de eu ser uma pessoa que quando o sono bate, o sono bate, não importa a circunstância – fora que para ir embora é sempre um rolê a parte, às vezes mais caro que a ida por falta de pessoas para dividir a condução. Ao mesmo tempo em que, dependendo da circunstância e do dia, eu sou o cara do bora, não importa para onde. Ou seja, sou o famoso chato. Isso é importante para história.


Bom, tudo começou no fim de um namoro (é lógico, decisões erradas começam assim). E quem já passou por isso sabe que é um momento da vida meio paia, meio aleatório, tentando se encontrar no mundo de novo para seguir em frente. Na época eu trabalhava em uma agência de publicidade de Goiânia e não ganhava bem, apenas o suficiente para pagar as contas e contar as moedas para escolher algum lazer caso sobrasse algum cascalho. Foi no meio dessa fossa em que eu me encontrava que uma menina de Brasília que eu não conhecia direito puxou papo comigo no Instagram e me convidou para ir a um evento de cinéfilos ao ar livre em uma casa, em que veriam filmes do Tarantino (eu acho) e tomariam uma cervejinha, algo bem light e clichê. Minha mãe morava em Brasília, então eu teria onde ficar. Como estava numa bad sem fim, sem ânimo para sair para os mesmos lugares de Goiânia, pensei “por que não?”. Topei o convite.


Passamos a semana combinando, seria no sábado, começaria a tarde e seguiria noite adentro. Eu só precisava ver como ir para Brasília. Apesar de ser uma cidade próxima, os 50 reais do busão pesariam muito no meu orçamento já limitado. Até que na agência na qual eu trabalhava, ouvi um cara do atendimento, que por acaso também era da minha turma da faculdade, combinando uma ida para Brasília no final de semana para outro evento. Não éramos exatamente amigos próximos, mas como tínhamos uma boa relação e nos conhecíamos há bons anos, engoli o orgulho da vergonha e mendiguei uma carona. Ele animadíssimo falou que rolava, era só eu falar com a amiga dele que era a dona do carro da carona, cuja qual eu não conhecia. Falei com a motorista e ela também ficou animada e topou na hora, era só eu contribuir com uns 15 conto pra gasosa. Economias feitas, logística programada para o role inusitado e todos animados, tudo certo para a aventura, certo? Não é bem assim.


Lá pela quinta-feira, a menina do Instagram, que me convidou com tanto afinco para esse evento, simplesmente sumiu, parou de responder minhas mensagens. Na sexta o sumiço continuou e percebi o perdido que eu tinha tomado. No sábado pela manhã, dia da viagem, nem me dei ao trabalho de preparar uma mochila. Mandei um zap para a moça da carona que logo em seguida me ligou. É aqui que começa a história.


Sem uma desculpa melhor para dar, já que falar que eu desanimei de última hora depois de pedir carona seria meio que uma sacanagem, resolvi falar a verdade. Aqui fica a dica: sempre fale a verdade, por mais humilhante que ela possa parecer. Contei que tinha combinado para ir a um evento com uma menina em Brasília que deu o perdido nos últimos dias, então eu não tinha mais o que fazer na Capital Federal. A moça da carona (vamos chamá-la de Joaninha para ficar mais fácil, nome fictício), que sequer me conhecia pessoalmente, falou que não tinha problema, que era para eu ir mesmo assim, que se eu animasse eu poderia ir ao mesmo evento que ela e seus amigos iriam, incluindo o carinha que trabalhava comigo (vamos chamá-lo de Rocha, nome fictício). Falei que não sabia, que eu não estava muito na vibe, afinal, tinha acabado de terminar um namoro recentemente e ir para um evento mais agitado estava fora de cogitação. Foi então que Joaninha disse que o evento era a festa de aniversário do Caetano Veloso.


Pô, como não levar em consideração comparecer simplesmente na festa de aniversário do Caetano Fuckin Veloso?! Arrumei a mochila e topei a carona, mas ainda não tinha certeza se iria à festa. No pior das hipóteses, eu aproveitaria o fim de semana para ficar no colo de mãinha.


Pé na estrada.


O carro tinha Joaninha, Rocha e outra pessoa que também estava pegando carona. Diferentemente do que pensei, não fiquei tão entusiasmado com a ideia de ir à festa de aniversário do Caetano, o meu astral estava mais para a bad do que para good vibes. Quando me deixaram na casa da minha mãe, pensei que o melhor a se fazer era realmente ficar quieto. Disse para o pessoal que entraria em contato informando da minha decisão, se iria ou não com eles para a festa.


Já no apartamento da minha mãe, praticamente só lanchei a tarde e dormi. Aqui um fato importante: o apartamento da minha mãe ficava em um prédio no meio de vários outros prédios extremamente idênticos em um setor chamado Cruzeiro Novo. Boa parte dos apartamentos dessa região são apartamentos funcionais do Exército Brasileiro, ou seja, apartamentos cedidos para militares morarem. O apartamento da minha mãe tinha uma planta padrão dos outros blocos – como eu sei disso, logo você saberá. E o apartamento dela era abarrotado de coisas em um espaço apertado, inclusive o quarto em que eu dormia.


Talvez pela semana de muito trabalho ou pela carga emocional que eu vivia ou pelos dois, dormi a tarde inteira e emendei a noite, acordando por volta das 20h. Acordei desesperado pensando “putz, a festa”. Tentei ligar para o Rocha, que não me atendeu. Pensei que a noite havia acabado e que eu tinha feito o meu melhor. Mas passada mais ou menos uma hora, o Rocha me ligou de volta dizendo que todo mundo havia dormido também e que só estavam acordando agora e ainda iriam se arrumar para a festa e que eu devia ir também. Até minha mãe olhou para mim e disse “você não ia sair?”. Constrangido por não estar aproveitando a minha juventude, me arrumei e chamei o Uber para ir até a casa em que o Rocha estava hospedado. Antes de sair, minha mãe me deu um molho com três chaves para entrar em casa na volta: uma para o portão de grade do prédio (cada bloco do Cruzeiro Novo era rodeado por um portão de grade), uma para a porta de vidro do hall de entrada que ficava logo após o portão e outra para a porta do apartamento em si.


Cheguei por volta das 22h no apartamento em uma das asas de Brasília que eu não fazia ideia de qual que era. Pensando que já estava atrasado, cheguei até apressado, mas me deparei com uma casa repleta de baianos que ainda estavam terminando de acordar para se arrumarem. Brasília tem dessas, uma hora você é goiano numa casa de potiguares e acaba parando em um reduto de baianos. Tem gente do Brasil inteiro nessa cidade, pensei. E como a programação era ir à festa de aniversário do Caetano Veloso, até que fazia sentido eu estar rodeado de baianos. No meio daquele sotaque carregado de salvador, eu assistia todo mundo falando com um gingado típico e em alta velocidade, comentando o jogo do Brasil de futebol feminino nas olimpíadas. “Essa Marta joga pá porra”, alguém disse. Eu ainda estava deslocado, todo matuto e sem jeito como sou, já que não conhecia ninguém ali além do Rocha, que àquela altura devia estar tomando banho. Finalmente alguém me ofereceu uma bebida “pegue naquela caixa de isopor, meu rei, tem copo na cozinha”. Fui seco na caixa de isopor para pegar uma lata de cerveja até que: Catuaba Selvagem.


Eu odeio catuaba. O gosto já me dá um pouco de ânsia, só o cheiro me dá refluxo, é realmente difícil de descer. Mas no meio da empolgação de todos em volta e daquela hospitalidade de estranhos que não me deviam nada, fiquei com vergonha de recusar, de parecer uma frescura da minha parte (que de fato era, convenhamos). Sorri, peguei meu copo, enchi de gelo e mandei ver na catuaba. O primeiro copo foi difícil de descer. Mas do segundo pra frente (deve ter sido uns 3 ou 4) desceu que foi uma beleza. Mesmo calado e no meu canto, já fiquei totalmente alegrinho, afinal de contas eu ia à festa de aniversário do Caetano Veloso!


Chegando a hora de chamar os Ubers para festa (com o tanto de pessoas reunidas tínhamos que ir em dois carros), alguém perguntou se todo mundo já estava com ingresso. Eu fiquei sem entender. “Ingresso? Que ingresso?” perguntei. O Rocha disse que não tinha problema, que era só comprar na porta. Como eu estava no grau e já estava “na chuva”, por que não “me molhar”? Não questionei mais e fui, mas não sem antes comentar “pô, esse Caetano Veloso anda capitalista pra cacete, cobrando ingresso pra festa de aniversário”. O Rocha riu e disse “você é engraçado demais”. Fiquei sem entender.


Fomos para o local da festa, já passava muito da meia noite. O local era uma espécie de píer muito bonito, com um barco de dois andares ancorado em algum desses lagos artificiais de Brasília. Enquanto todos com seus ingressos iam para entrada da festa, fui até a bilheteria. Valor do ingresso: 45 reais. Engoli seco. Perguntei se dividia o valor no cartão, afinal, eu era um publicitário fodido. Não só não dividia como o pagamento era só em dinheiro. O sangue desceu da cabeça. Já imaginei o constrangimento de ou ter que ir embora (e pagar sozinho uma fortuna de Uber), ou pedir dinheiro para alguém – qualquer opção era ruim naquela altura. Por algum milagre divino, abri a carteira e tinha exatamente o valor da entrada do ingresso em papel moeda. Entrei aliviado.


A festa era realmente boa, tocava músicas da tropicália, Novos Baianos, Jorge Ben e, claro, Caetano Veloso. Mas nem sinal do anfitrião. Fui ao bar da festa e tive outra surpresa: não era open bar, a bebida também tinha que ser paga – e o que havia de mais barato ali era long neck, que não era de fato barata. Procurei o Rocha, que já tinha sumido dentro da festa, e quando finalmente o encontrei, perguntei que horas seria o parabéns. Ele só riu da minha cara e disse pra eu aproveitar a festa. Olhei em volta, o estilo das pessoas e foi aí que a ficha caiu.


Aquilo até que poderia ser uma festa maneira, mas não parecia ser de forma alguma uma festa organizada pelo Caetano Veloso. Perguntei para um estranho do que se tratava de fato e explicaram que era uma festa chamada Odara, que já era tradicional e que aquela edição era especial em comemoração ao aniversário do Caetano Veloso. Ri de nervoso. Como fui ingênuo. Talvez se eu não tivesse tomado as catuabas antes eu teria ficado puto, mas não era o caso. Levei tudo numa boa e o riso de nervoso virou um riso de conformação. Comprei umas fichas de long neck (essas passavam no cartão) e fui aproveitar a festa do jeito que dava. Daí em diante só me lembro de flashs e por isso vou me atentar ao que me lembro com alguma clareza.


Como disse lá no início, quem me conhece sabe que sou uma pessoa que sente sono. Depois de ingerir tanto álcool e não comer nada (se a bebida era cara, o preço da comida ali era impraticável), comecei a ficar derrotado, mas me aguentei firme. O sol começou a nascer no horizonte e foi uma das paisagens mais bonitas que já vi na vida. Quando finalmente Rocha decidiu ir embora, fui com ele, já de dia. Eles pararam para comer alguma coisa em algum lugar que não faço ideia de onde é, e aí, meu amigo, já não dava mais para mim, a minha pilha interna se descarregou. Fiquei dormindo na cadeira enquanto os outros comiam. O Rocha ficou preocupado e foi falar comigo. Falei totalmente bêbado, mais de sono do que de bebida (mas também de bebida) que estava tudo bem. Fico imaginando qual credibilidade passei nessa hora. Dei meu celular para o Rocha e pedi para ele chamar um Uber para mim. Nessas horas é que eu me amo: eu havia anotado o endereço da minha mãe e deixado salvo de uma maneira fácil para caso de um blackout acontecesse dentro de mim. O Rocha chamou o Uber, me colocou dentro do carro, devolveu meu celular e disse preocupado: “amigo, se cuida”.


O caminho inteiro fui variando entre pescadas e cochilos leves, largado e segurado apenas pelo cinto de segurança, tal qual um morto muito louco. Pedi para deixar a janela aberta. O motorista evidentemente estava com medo de eu vomitar. Ao chegar ao destino, no bloco do Cruzeiro Novo, desci do carro, agradeci o motorista, que olhou para mim e disse com muita sinceridade nos olhos “se cuida e fica bem, tá?”. Agradeci de novo, dessa vez sem entender tanto o recado e fui para a mais difícil das missões da minha jornada até ali: conseguir abrir o portão de entrada.


Lembra que minha mãe havia me dado um molho com três chaves e o primeiro chefão para se superar era o portão da rua? Pois é. Nessa altura da história, o sol já estava estabelecido no céu e eu, com minha embriaguez de álcool e sono, não queria encarar os raios de luz da manhã. Com os olhos cerrados, mais dormindo do que acordado, tentei abrir o portão de tudo que é jeito, colocando uma chave, invertendo a posição, depois tentando a mesma coisa com a outra chave e com a terceira, até voltar na primeira de novo e recomeçar o processo. Depois de um tempo que pode ter sido 30 segundos ou 30 minutos, um homem que estava saindo do prédio, provavelmente para comprar pão pelo horário, perguntou se eu estava tentando entrar. Eu disse que sim e ele gentilmente abriu passagem para mim.


Passei pelo portão gradeado. A segunda porta, a de vidro do hall de entrada, ainda estava aberta, pois o homem tinha acabado de passar por ela sem ter dado tempo de fechá-la totalmente. Subi as escadas para o andar do apartamento da minha mãe. Quando fui abrir a porta, para minha surpresa, ela já estava aberta. Depois de perder tanto tempo no portão da rua, Deus finalmente começou a me ajudar, pensei.


Entrei pela sala e percebi que minha mãe havia dado uma ajeitada na posição dos móveis. Fui direto para o quarto. Sentei na cama e quando me preparava para deitar, dei uma última olhada em volta antes de me entregar ao sono dos justos. Foi nesta última olhada que percebi que minha mãe também mudou a decoração do quarto durante a noite. Dei uma piscada e... Meu Deus do céu, o quê que eu tô fazendo aqui?! Essa não é a casa da minha mãe! Preciso sair correndo antes que me vejam!


Todo sono e alcoolismo sumiram do meu corpo instantaneamente. Eu havia invadido um domicílio e poderia ser preso caso alguém me encontrasse ali, mesmo não sendo minha culpa, afinal, todos os blocos de prédios naquele setor eram idênticos e existiam sei lá quantos deles. Mas até eu explicar que Jesus não é Genésio... Só agora fazia sentido as chaves não funcionarem nem viradas para cima e nem para baixo. Sai do quarto tentando não fazer barulho, passei pela sala e saí do apartamento mais ligeiro que um peido.

Consegui abrir a porta de vidro do hall pelo lado de dentro com ajuda daqueles botõezinhos instalados na parede do prédio. O problema mesmo estava no portão da rua. Desesperado, vi que para sair de qualquer jeito antes que alguém me visse e eu ser descoberto como um criminoso era pulando o portão.


O portão devia ter uns dois metros e meio de altura, com um apoio que daria para colocar o pé mais ou menos na metade desta altura. O alto do portão era ornado com aqueles espetos virados para cima, que mais pareciam pontas de faca ou de lança. Era um portão, você sabe o que é um portão. Apesar da minha mente estar muito mais acordada do que antes da injeção de adrenalina que tomei ao perceber que estava no apartamento errado, meu corpo não respondia aos meus movimentos como eu gostaria. Tive que me concentrar como nunca antes na vida. Coloquei força nos braços, tomei um impulso forte e consegui escalar um pé na metade do portão e o outro já atravessando para o outro lado. Não dava para eu sentar no topo do portão por causa dos espetos em cima das grades. Fiquei fazendo força com os braços como um ginasta segurando nas alças do cavalo. Mesmo com a pressa, eu precisava me concentrar para passar a perna que estava do lado de dentro para o lado de fora, num calculo de força muito preciso para eu não me lascar nos espetos e não me estrebuchar no chão como uma jaca. O portão já era alto e eu com a minha altura deixava minha cabeça facilmente a mais de três metros do chão. O mundo girava. Respirei fundo e decidir ir no três. Um, dois, TRÊS!


REEEEC!


Aterrissei no chão sem cair, com os dois pés apoiados na calçada. Mesmo assim senti que algo havia se enganchado no portão e se rasgado por completo. Temi pelo pior. Fechei os olhos com medo da verdade e levei a mão para o meu traseiro. O pior não havia acontecido: só minha calça havia se rasgado. Com o menor dos prejuízos possível dado as circunstâncias, segui minha jornada pela rua com a bunda de fora para quem quisesse ver para achar o bendito bloco de prédio que era o da minha mãe. Caminhei de um lado para o outro tentando me lembrar de algo que identificasse o bloco certo. O quê que poderia ser? Uma lanchonete! Tinha uma lanchonete na frente. Andei mais uns cinco minutos e achei a lanchonete com o bendito bloco à sua frente.


Passei pelo portão e pela porta do hall sem dificuldades. Entrei no apartamento e vi que a decoração era a mesma de sempre. Cheguei no quarto, tirei a calça e me deitei na cama do jeito que estava. A cachaça e o sono, que tinham me dado uma trégua, bateram de novo com toda força do mundo e me entreguei. Horas depois, acordo com minha mãe me cutucando.


- Filho, filho... Por que sua calça tá no chão toda rasgada?


Olhei para cara dela, para a calça rasgada no chão e de novo para ela. Pensei em todas as desculpas possíveis, mas meu cérebro ressaqueado não cooperava com a criatividade. Joguei a toalha e respondi:


- Se eu te contasse a senhora não iria acreditar.


Depois de me banhar e tomar café da manhã, sem ter uma história em mente para inventar, optei pela verdade (ela é libertadora!) e contei o que havia acontecido. Minha mãe e o marido dela ouviram tudo um tanto quanto abasbacados.


- Meu filho, aqui na redondeza só tem militar, você poderia tomar um tiro!


- Se te pegassem era capaz de achar que você estava bêbado.


- Eu, bêbado? Imagina...


Na segunda-feira após o ocorrido, o Rocha me perguntou preocupado se eu estava bem, porque ele achava que eu estava completamente detonado pela pingarada. Eu ri e disse que eu era assim mesmo, que eu ficava com muito sono naturalmente, ainda mais quando bebia um pouco além da conta, mas que eu não estava tão destruído quanto parecia, afinal, é preciso ter muita força para fugir de um apartamento invadido pulando um portão alto com espetos na ponta.


A história aqui relatada é realmente verdadeira. Talvez eu tenha omitido alguma coisa por não me lembrar. Às vezes até me pego pensando se não havia alguém dentro do apartamento que invadi, seja no outro quarto, na cozinha, no banheiro ou até mesmo na sala e no quarto que entrei. Me pergunto se simplesmente não consegui ver alguém ali de tão bicado que eu estava. Ou até mesmo se o apartamento não era da pessoa que abriu o portão para mim com tanta boa vontade.


De todo modo, foi assim que tomei um bolo para um evento de cinema, enfiei o pé na jaca da catuaba numa casa cheia de baianos, fui para a festa de aniversário do Caetano Veloso sem Caetano Veloso, invadi um apartamento sem querer e rasguei a calça ao fugir. Até hoje tenho a calça, que mandei para a costureira e usei mais algumas vezes até engordar demais para caber dentro dela, mas ainda tenho esperanças de emagrecer para poder usá-la mais algumas vezes em outras aventuras, de preferência menos arriscadas.

  • Jul 30, 2020
  • 7 min read

Ai, as palavras. Tão mágicas que só elas. E não, não sou só eu que estou dizendo. Quem disse isso para mim foi quem mais entende de palavras e de mágicas. Com a palavra mágica, Alvo Dumbledore:


“Palavras são, na minha nada humilde opinião, nossa inesgotável fonte de magia. Capazes de formar grandes sofrimentos e também de remediá-los”.

Na boa, eu podia parar o texto por aqui, justificar que escrever mais qualquer coisa, portanto, se tornaria desnecessário, uma vez que um dos maiores bruxões de todos os tempos já lacrou e só parar para aconselhar todos vocês a ensinarem interpretação de texto aos seus filhos, uma mágica que faz toda a diferença para toda a vida – e se vocês não sabem interpretação de texto o suficiente para ensinar, pediria que valorizassem quem os ensina. Mas vou aproveitar do espaço para me alongar por mais alguns parágrafos e mostrar que Dumbledore sempre esteve certo.


De fato acredito que as palavras são mágicas e é por isso que dedico um tanto do meu tempo a elas. Porém, como toda mágica, existe o lado bom e existe o lado ruim – como diria Sirius Black, luz e trevas dentro de você e blá blá blá (vão ler Harry Potter e parem de me encher o saco!) – e, principalmente, existe o lado misterioso.


Vou começar explorando o mistério. Já adianto que vou falar muita potoca. E essa frase anterior não foi só para chamar atenção pelo que vem adiante. Ela (agora é a penúltima frase anterior) foi escolhida cuidadosamente só para eu colocar a palavra “potoca” no meio. São palavras como “potoca” que a gente vê o tanto que a língua portuguesa é incrível. Olha essa sonoridade. Experimente falar “potoca” sílaba por sílaba, reparando no movimento da boca. É quase uma mistura da sensação de abrir uma garrafa de champanhe montado em um cavalo em pleno trote ritmado. Uma grande besteira assim como é o próprio sentido da palavra “potoca” – isso é mágica. E ter essa mágica em dizer uma palavra com essa sensação é um grande mistério.


Parêntese: achou que eu ia falar que palavra tem poder, né? Falhou vigorosamente, porque eu não entendo disso e poder da palavra é um mistério que não domino. Então, amém, namastê e saravá.


Continuando no mistério, tanto para o bem, quanto para o mal, existem as palavras que surgem com um sentido de solucionar um problema e logo em seguida essa palavra se torna um problema. Achou literalmente confuso? Então estamos na mesma página, porque quero falar da palavra “literalmente”.


Não sei como e quando ela começou a ser usada no vocabulário, mas imagino que fosse para dar ênfase e evitar confusões em alguma história que estava sendo contada, deixando claro que não se tratava de uma metáfora e que era exatamente aquilo que estava acontecendo. Inclusive, uma vez eu contava uma história em que eu encerrava com um final não-literalmente épico:


Aí eu fiquei literalmente todo cagado.


Uma amiga prontamente tentou me corrigir:


Amigo, você não tá fazendo uso correto da palavra literalmente.


Não me restou outra alternativa a não ser confirmar:


Estou fazendo o uso correto sim, eu fiquei realmente todo cagado.


É claro que essa história não existe literalmente mas foi o melhor recurso que encontrei para explicar a confusão causada. Acontece que agora as pessoas usam a palavra “literalmente” para se referir ao sentido figurativo e não sei se elas se dão conta disso, o que pode causar aberrações, apesar da melhor das intenções. Exemplo de frase sem “literalmente”:


O presidente é um bosta.


Sem o uso do “literalmente” dá para entender o sentido da frase, porém, ela carece de um pouco de ódio. Acredito que por isso muitas pessoas fazem uso do advérbio para dar uma intensidade necessária:


O presidente é literalmente um bosta.


Viu como mudou? Infelizmente, o presidente em questão é realmente um ser humano do pior tipo, o que o coloca até mesmo em uma categoria muito parecida com estrume, mas no frigir dos ovos da língua portuguesa, o uso do literalmente está incorreto – apesar de ser uma forma totalmente compreensiva e até mesmo pertinente de uso.


No mesmo tópico de usar palavras que tem um tipo de uso e que muitas pessoas acabam usando em outro sentido, temos a palavra “através”. A magia aqui se torna confusa porque a palavra “através” é usada para algo que atravessa ou passa literalmente (rs) por alguma coisa, como um espelho, um vidro ou qualquer meio físico que realmente existe. Por exemplo:


A faca passou através do abdome.


Nesse caso, estamos explicando que uma facada acontece quando a faca passa através de um meio físico, portanto, o emprego da palavra está correto. Porém, muitas vezes, as pessoas usam o “através” de maneira equivocada, no sentido de “por meio de”. Explico:


Ex-assessor parlamentar recebeu mais de R$ 2 milhões através de 483 depósitos.


Aqui, o uso do termo é incorreto, porque o sentido que a frase quer passar é de um intermediário. O correto, de acordo com a língua portuguesa seria:


Ex-assessor parlamentar recebeu mais de R$ 2 milhões por meio de 483 depósitos.


Infelizmente é muito difícil deixar essa frase ainda mais correta, já que seria brigar com os fatos. De todo modo, acredito que consegui explicar.


Seguindo o raciocínio, existem também as confusões que só aparecem na forma escrita. Uma muito comum é a na forma correta de acentuar algumas palavras. Por exemplo, em um momento de fúria, é capaz de alguém deixar um comentário nas redes sociais da seguinte forma:


Ei, Bozonaro, vai tomar no cú!


Acredito eu que este acento é quase uma extensão da exclamação, uma forma de enfatizar indignação, fruto de uma vontade genuína de ofender, colocado no calor das emoções. Mas neste caso, está incorreto. Para nunca se esquecer, lembre-se da máxima de que se no assento vai o cu, no cu não vai acento. É ou não é de cair o dito cujo da bunda?


Dando uma relida em tudo o que escrevi até aqui, acho que acabei pegando pesado com os exemplos. Vou tentar voltar a exemplos mais pessoais e leves para tentar me adiantar e não cair em tentação.


A verdade é que as palavras da língua portuguesa pregam peças em todos, como aconteceu com o nosso querido Alfredinho no conto que publiquei aqui no blog semanas atrás, em que o personagem não sabia que a flexão correta do verbo “ouvir” na 1ª pessoa do singular do presente do indicativo é “ouço” e não “ouvo”. E são inúmeros os verbos irregulares que temos que não fazem nenhum sentido para mim e nem para Alfredinho, tipo a flexão do verbo “escrever”, que no particípio é “escrito” e não “escrevido”. Chato, né? E tudo isso que tá escrito nesse parágrafo também tá muito chato, então, vamos adiante.


Um bom lugar de se ter mágica acontecendo é a cozinha. E nesse ambiente as palavras fazem toda diferença. Adoro ver vídeos e programas de culinária para tentar aprender alguma coisa e replicar receitas na prática. Nessas horas, o sentido das palavras pode causar confusões. Uma coisa que nunca entendo é a verdadeira medida do “fio de azeite”. Sempre tem algum chefe que fala “agora é só colocar um fio de azeita” e pá: despeja um tanto de azeite que eu usaria em umas cinco refeições e ainda sobraria um pouco para passar na pele e pegar um bronze tal qual os gregos faziam – fora que azeite pode ser gostoso, mas não é barato não. Será que assim como a medida do sal é “a gosto” a do azeite é “fio”?


Foi também neste ambiente que mágicas aconteceram com o nome de alguns objetos. Com destaque para as nossas tradicionais cumbucas, que quando mais refinadas eram chamadas de tigelas, mas, sem que percebêssemos, passaram a ser chamadas de “bowls”. Só me dei conta disso quando me falaram “me passa o bowl, por favor” e eu fiquei sem entender do que se tratava. Apontaram, então, para o objeto e eu entrei em parafuso por entender que aquilo era sim um bowl e eu não me lembrava mais que eu chamava aquilo de cumbuca até outro dia. Não sei ainda se foi uma troca desnecessária ou se é o sinal de evolução dos tempos.


Falando em cozinha, também foi só outro dia que descobri que aquela concha furadinha que a gente usa para fritura e até para pegar o arroz se chama “escumadeira” com C e não “espumadeira” com P, o que me tornou uma chacota – não é porque eu gosto de escrever que saber a forma correta das palavras se torna algo fácil para mim. Além do mais, sou de peixes, preciso de um desconto na minha dislexia natural trazida pelos astros.


No caso da escumadeira, é tudo uma questão de sonoridade (não confundir com sororidade) e de minha completa falta de atenção. E em tempos atuais, esse tipo de confusão sonora pode causar uma grande confusão mental. Por exemplo, no diálogo:


- Eu vim com minha mãe, peguei carona.


- O quê? Pegou corona?!


No fundo, somos todos Velhas Surdas e ouvimos o que queremos, talvez por mecanismo de defesa, talvez por estarmos sempre com a guarda alta em relação a alguns assuntos, mas isso é outra pauta. E já que falamos em confusão sonora, existem dois recursos mágicos que tornam as palavras ainda mais mágicas na sonoridade. De novo: para o bem e para o mal. Estou falando do aumentativo e do diminutivo.


Começando pelo aumentativo. Um dos meus preferidos de todos como bom botequeiro (leia com calma para não ler errado, por favor!), é o famoso litrão que a gente pede (ou pedia em tempos normais, se você for um ser humano com as faculdades mentais normais o suficiente para evitar frequentar ambientes públicos sem máscara) ao sentar na mesa do bar. Acontece que o litrão contém exata e unicamente um litro de cerveja, o que torna esse aumentativo um aumentativo ilusório. Se o conteúdo líquido fosse de 1,2L (sendo pessimista) ou 1,8L (sendo otimista), talvez essa modalidade de cerveja faria mais jus ao apelido adquirido. Entretanto, trocando em miúdos, a forma de tratamento da garrafa de um litro de cerveja ser no aumentativo torna a experiência de ir ao bar mais mágica e satisfatória.


Um adendo: se o conteúdo que vai ser consumido é cerveja, substantivo feminino, e está armazenado em uma garrafa, também substantivo feminino, por que não usar uma flexão do litro também no feminino? Quando a pandemia passar, experimente ir ao bar e dizer:


Meu consagrado, me vê aí uma litrona de Antárctica! Mas é aquela lá do fundo do freezer, hein?


Ainda nos aumentativos, existem outros que não são tão ilusórios assim, que mostram o tamanho da sujeira que você está enfrentando, como o mensalão, o petrolão ou até mesmo o timão (brinks esse último – ou não).


E assim como os aumentativos, os diminutivos também fazem das suas. Existem os diminutivos que exercem sua magia para o bem, como aquele bom e velho conjunto de 300 segundos que mesmo no diminutivo, continuam tendo o mesmo período de tempo:


Ah, não, só mais cinco minutinhos.


Mas não se deixe enganar. As palavras, até mesmo nessas formas mais carinhosas, carregam sentidos perversos, devastadores, causadoras de verdadeiras “rachadinhas” na nossa sociedade. Ou vai me dizer que você ainda acha que tudo isso que estamos passando nos últimos meses é só uma “gripezinha”?

Formulário de inscrição

Obrigado(a)

  • Instagram
  • Twitter

©2020 by Neris Reis. Proudly created with Wix.com

bottom of page